Após 23 anos de banca, e 265 edições publicadas, Moto!, revista criada e comandada desde setembro de 1994 por Roberto Agresti ([email protected]) é mais uma a sucumbir à dura realidade do mercado editorial brasileiro. Depois de cumprir “a duras penas” a programação de 12 edições em 2016, a revista teve apenas três neste ano.
“Mesmo com algum atraso, conseguimos cumprir nossa programação no ano passado, mas as contas já não fechavam mais faz tempo”, explica Agresti. “Mesmo com o faturamento ruim, acreditei que poderia haver uma reação, o que não ocorreu. Com isso, e após algumas tratativas para dar continuidade ao título se mostrarem inviáveis, decidi pelo fim da revista”.
Ao contrário de muitos veículos, que ao optarem por encerrar suas edições impressas mantêm a versão digital, este não será o caso da Moto!, garante: “Fundamentalmente, por causa da resposta comercial dos anunciantes que, paradoxalmente, continuavam preferindo colocar seus reais no papel pintado e pedir um banner de presente. Desde sempre foi assim”.
A redação era enxuta: além de Agresti, integravam a equipe o repórter Julio Rosenfeld e os colunistas José Eduardo Donatelli (Motomarketing) e Bruno Corano (Segurança).
Em entrevista ao boletim Jornalistas&Cia Imprensa Automotiva, ele falou sobre a história do título, os recentes períodos de crise e o futuro do segmento.
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Jornalistas&Cia Imprensa Automotiva – Como surgiu a idéia de fundar a Moto!?
Roberto Agresti – Após “ser saído” da Editora Três, em julho de 1994. Lá comecei minha carreira jornalística em 1983, fugindo da publicidade, e em 1987 fui alçado à condição de diretor Editorial da Motoshow. No meio de 1994 desentendi-me com Domingo Alzugaray, dono da Três, e ele me demitiu, transformando a revista (único título líder da editora à época) em Motorshow, voltada ao segmento de quatro rodas. Ele queria fazer isso havia tempos e eu não concordava; achava que ele deveria reabrir a extinta Motor3 e manter a Motoshow. Depois do estresse da briga, Domingão foi generoso. Recebeu-me e convenci-o a ceder todo o arquivo, deu-me informações cruciais e incentivou a fundação de Moto!. A Três foi uma grande escola para mim e ele, mais do que um patrão, um padrinho.
Somando os 11 anos de Motoshow, na banca praticamente sem interrupção, foram 380 revistas falando de motos com meu nome no expediente, quase 350 como diretor.
J&Cia Auto – Que outros nomes de peso integraram esse expediente nos últimos 23 anos?
Roberto – Basicamente o “núcleo duro” de Motoshow foi a raiz da Moto!, que durante sua existência caracterizou-se pela pouquíssima rotatividade. Marc Pétrier, Felipe Passarella, Geraldo “Tite” Simões, Paulo Almeida Filho, Eduardo “Minhoca” Zampieri e, mais recentemente, Laner Azevedo e Julio Rosenfeld, entre outros.
J&Cia Auto – Ultimamente a revista contava com uma equipe mais enxuta, mas quantos profissionais chegaram a integrar a redação nos “tempos áureos”?
Roberto – No tempo das vacas gordas chegou a ter seis ou sete profissionais, mas uma característica peculiar de nossa equipe desde sempre foi que não havia barreiras entre departamentos: o pessoal da Arte andava de moto, fotografava, participava dos testes e assim acontecia também com a turma do Comercial. Chegamos a ter 12 pessoas trabalhando sob o mesmo teto diariamente e, com raras exceções, todos tinham envolvimento com as pautas na prática, ou seja, pilotavam motos.
J&Cia Auto – Quando foi esse período de maior efervescência?
Roberto – Estreamos por cima, surfando a boa onda da estabilidade econômica do Plano Real, que proporcionou um crescimento praticamente constante do segmento moto. Creio que o auge da revista foi de 1998 até 2008, liderando o mercado a despeito da entrada de novas publicações.
Acho que nosso grande mérito foi ter trazido ao segmento um padrão gráfico superior. Introduzimos o papel couché, a lombada quadrada e um cuidado na impressão até então inédito. Nossa revista puxou para cima o nível gráfico das publicações e teve como grande diferencial privilegiar uma linha editorial que trazia muito do que acontecia no exterior, tanto em termos de produto quanto ao nível do esporte motociclístico, no qual nunca teve concorrente à altura.
J&Cia Auto – E quando a crise começou a ser mais sentida?
Roberto – Paradoxalmente, foi em 2011, ano em que o mercado teve recorde de produção, com 2,2 milhões de motos vendidas. No final da década de 2000 o mercado de motos “bombou”, crescendo durante vários anos à razão de dois dígitos e isso fez nascer muitas publicações, o que provocou uma lógica dispersão dos leitores.
Muitas dessas novas revistas, para se colocarem no mercado, derrubaram o preço das páginas de publicidade, vendendo anúncio a troco de banana ou quase. Isso coincidiu com o crescimento da internet e daí por diante tocar com sucesso o negócio não dependia mais do “fazer bem feito”, mas sim do “fazer mais barato”, ou oferecer um algo a mais que eu não soube ou não quis fazer.
J&Cia Auto – O quê, por exemplo?
Roberto – Refiro-me especialmente aos “prêmios”, que viraram febre. Eu nunca engoli direito esse tipo de ação e isso foi um enorme erro estratégico, pois os departamentos de Marketing adoram esses eventos e eu, particularmente, sempre achei tudo muito complicado sob diversos pontos de vista, inclusive o ético. No fim, o que rola é um jeitinho de premiar todo mundo. Não instituir um “Prêmio Moto!” foi errado sob o lado prático, mas ao menos fui honesto com minhas convicções.
J&Cia Auto – Além do trabalho na Moto!, que outras atividades você vem desenvolvendo?
Roberto – Sigo no UOL e faço testes de carros para o site AutoEntusiastas, do Bob Sharp. É algo que me desafia pelo padrão de exigência enorme dele e do restante da equipe, todos “vacas sagradas” do ambiente do automóvel. Há três anos também sou comentarista da CBN, onde faço o CBN Moto, todos os domingos às 11h50, dentro do CBN Esporte, apresentado pelo Carlos Eduardo Eboli.
Adoro fazer rádio e para mim esse espaço de cinco a dez minutos por semana em uma rádio expressiva, e em cadeia nacional, é algo de estupendo para o segmento da moto, uma conquista. Falar do tema em uma revista especializada é como pescar em um pesqueiro, o peixe já está pego. Já no rádio a linguagem é outra e o público heterogêneo, um desafio que me motiva demais. Dar o recado de que moto, se bem usada, é solução e não problema, é meu lema…
J&Cia Auto – Quais seus planos a partir de agora?
Roberto – Pretendo continuar no mundo da motocicleta dando o recado, como o que acabei de enfatizar. Posso atuar como jornalista ou consultor, ou ainda em qualquer atividade em que minhas três décadas de experiência no setor possam ser úteis. Minha pretensão é poder mostrar a lógica que existe no uso desse veículo, desde que haja bom senso. Motos e motociclistas estão sendo muito malvistos e com razão: há bem pouco tempo moto era algo exclusivamente para o lazer. De duas décadas para cá virou ganha-pão de muitos e este uso “pressionado”, aliado à má educação, traduziu-se em mau uso e incompreensão generalizada.
J&Cia Auto – Em apenas um ano e meio, é a segunda revista de duas rodas que fecha as portas [N.daR.: a Cycle World, da Editora Escala, fechou no primeiro semestre de 2016]. Em sua opinião, o segmento ainda comporta e consome esse tipo de mídia?
Roberto – A crise que matou a Moto!, a CW e antes delas a Motomax, da Editora Europa, creio que ainda fará mais vítimas. Acredito que as revistas continuarão a existir, mas, como já está ocorrendo na Europa, a qualidade gráfica deve ser elevada, assim como haver complementaridade. É fundamental uma edição digital associada a um site verdadeiramente dinâmico para as hard news e, é claro, vídeos em canais como o Youtube e nas redes sociais. Isso exige investimento enorme para cativar um leitor que não mais se satisfaz com receitas manjadas e econômicas, mas quer uma experiência completa. Atualmente no Brasil ninguém fechou esse circuito e nem pode, pois o segmento está deprimido e os anunciantes, sem saber onde mirar, atiram pra todo lado. Idem os leitores, que estão dispersos e perderam referências e sem um norte que os estimule para o exercício da aquisição de informação.
J&Cia Auto – Um possível reaquecimento do mercado pode permitir o retorno da revista?
Roberto – Ainda acredito no impresso, mas de qualidade gráfica excelente e associado a outras mídias. O futuro da informação sobre motocicletas e congêneres deve passar por uma revolução. Menos estereótipos – o tal do “vento na cara” e o “pertencer à tribo X ou Y” cansou. O futuro da informação passa por “o que esse veículo me traz em termos de vantagens?”.
As motos elétricas estão chegando e com elas um novo tempo. Sob esse prisma há que se repensar o jornalismo especializado em veículos de um modo geral, não só o de motocicletas. Todavia, não é possível deixar de lado que, dentre os veículos criados pelo homem, a moto exerce um fascínio particular. Só quem anda de moto sabe como tudo isso é verdadeiro.
De fato senti que há grande consternação com o fim de Moto!, mas o declínio do mercado e a mudança do padrão dos leitores – além dos erros de gestão – desembocaram nisso. Sem lamentos: tudo tem começo, meio e fim e sinto-me realizado como jornalista e privilegiado por ter estado por tanto tempo à frente de um veículo inegavelmente relevante em seu segmento.
A revista Moto Poderia ao menos ter um canal no youtube ou mesmo um blog, pois hoje só tem porcaria nessa área, Agresti reconsidere e se precisar começe com um baixo custo, se quiser posso ajudar.
Uma pena uma revista tão conceituada encerrar os trabalhos. Mas tudo que ele disse tem um grande fundamento nos dias atuais… a Internet. A maioria das publicações tem um “braço digital” e penso que num futuro bem próximo não haverá mais papel, tudo será em sites e canais no youtube… com certeza fica uma grande lacuna na mídia… eu era leitor de banca da Revista da Moto, na época era a melhor revista, com o melhor conteúdo. Vai deixar saudades !!!
Leio sobre motocicletas há muito tempo e a MOTO! tinha o melhor texto (e o melhor papel físico) entre as revistas do segmento, incluindo algumas do setor automotivo; a maioria é fraca repetitiva e cheia de erros de português. Eu comprava MOTO! todo mês e mais algumas revistas com outros títulos. Entendo que o ato de ler está cada vez mais raro, o pessoal prefere mais ver o vídeo no Youtube, e isso criou espaço para pessoal não especializado, os aventureiros que muitas vezes querem apenas se mostrar, sem qualquer conteúdo analítico do veículo. Tá difícil separar joio do trigo. Espero que continue emitindo suas opiniões, Agresti, e contribuindo para desmistificar a imagem da motocicleta. Forte abraço!
Nenhuma revista de motocicletas, foi, é ou será melhor que a “Motoshow” Coincidentemente, havia dois estrangeiros na equipe e como se sabe, estrangeiro não é vagabundo como brasileiro!!! Com relação a outras revistas de motocicletas, a unanimidade entre elas é que são todas ruíns e frequentemente viram capachos de determinadas marcas de motocicletas!!! Fico feliz com o fechamento de cada uma delas, pois picaretagem não pode prosseguir por muito tempo!!!