Por Luciana Gurgel, especial para o J&Cia
Além de fundamental para a democracia, a solidez da mídia de um país é um dos pilares que asseguram sua influência sobre outras nações, colaborando para a relevância econômica e geopolítica. Esse é o entendimento da consultoria britânica Brand Finance, que reuniu em Londres em 25/2 mais de 200 diplomatas, jornalistas e autoridades para apresentar seu Global Soft Power Index.
Soft power é um conceito cunhado em 1990 pelo cientista político americano Joseph Nye, que descreveu o processo de empregar valores culturais e sociais como arma de influência em substituição ao poderio militar ou econômico. Os Estados Unidos lideram o ranking, seguidos por Alemanha e Reino Unido, praticamente empatados. O Brasil ficou em 29º, destacado como o mais influente da América Latina.
Pesquisa global – Há vários rankings de soft power. Para elaborar o dela, a consultoria fez uma pesquisa com mais de 55 mil pessoas em 100 países, combinando a opinião do público com a de líderes políticos, empresários, jornalistas e acadêmicos. Os países foram avaliados em três métricas – familiaridade, reputação e influência – e em sete pilares complementares: comércio e negócios, governança, relações internacionais, cultura, educação e ciência, pessoas e valores, e mídia e comunicação.
Nesse quesito, a pontuação ponderou a influência externa dos meios do país, a confiabilidade da mídia, a capacidade de comunicação da nação e o interesse em acompanhar assuntos a ela relativos. Foram concedidas “medalhas” aos campeões em cada um. Os Estados Unidos levaram ouro como país com a mídia mais influente, seguidos por Alemanha e Reino Unido.
O valor de uma indústria de mídia sólida para a importância global de uma nação emerge em vários pontos do relatório. No Reino Unido, o império da BBC, que atinge 426 milhões de pessoas por semana no planeta, figura como um dos atributos que valeram a posição no ranking, ao lado da mística da Família Real.
O resultado veio a calhar para a emissora, que sofre com o risco de perder a taxa obrigatória a ela paga por todas as residências britânicas. Entre os planos do Governo já sinalizados para a BBC está justamente concentrar esforços na programação voltada para o mercado externo. Outras nações tentam emular sua história de sucesso investindo em redes globais, como Russia Today, Al Jazeera, Press TV e CGTV.
O estudo mostra como fenômenos culturais e valores sociais contribuem para o soft power. Caso da Coreia do Sul, que com uma boa ajuda do K-Pop conquistou o 14º lugar em influência global, superando nações maiores e mais ricas.
Ou da Suécia, que ficou em nono lugar, à frente de gigantes territoriais e econômicos, alavancada pela alta pontuação em respeito ao meio ambiente graças à ativista Greta Thumberg. O que uma menina de tranças fazendo greve na porta da escola pode valer a um país… E ainda ajudou outros nórdicos, igualmente bem-vistos no contexto da mudança climática.
A influência do Brasil – O Brasil foi mais bem avaliado em familiaridade e reputação do que em influência. E levou medalhas – de bronze – apenas em esportes e alegria. Nossa maior pontuação foi em “grande lugar para visitar”, com 6.8, não tão longe dos 8.2 da Austrália. Nos critérios ligados à mídia os números ficam mais distantes dos líderes.
A influência da imprensa marcou 2.6, contra 7.3 dos Estados Unidos, o que certamente tem a ver também com o idioma. E a confiança na mídia mereceu 2.0, enquanto o Canadá ficou com 4.3. De qualquer forma, vale observar que globalmente a credibilidade da mídia anda frágil, pois o mais alto índice ainda é baixo.
Um dos participantes do painel que discutiu os resultados, Peter Fisk, da IE Business School de Madrid, chamou a atenção para o papel da Inteligência Artificial no futuro da mídia e em seu potencial de criar e manipular conteúdo capaz de influenciar audiências. No entanto, ele defende que o poder não estará nas mãos de quem manipula, mas sim dos mais confiáveis.
Além dos aspectos ligados à mídia, o estudo é valioso para entender a visão do mundo sobre os países à luz de questões contemporâneas, como democracia e respeito ao meio ambiente. Ele mostra como o alinhamento a valores universalmente aceitos pode legitimar liderança global. Segundo a Brand Finance, a razão é simples: os Estados, assim como as pessoas, tendem a confiar mais nos que compartilham os mesmos ideais.