Por Luciana Gurgel
Para quem tem apreço pelo Brasil e mora fora ou se informa pela mídia internacional, dói ver o País tão associado a notícias negativas como nos últimos dias.
A ausência do presidente Bolsonaro em Glasgow foi tratada como incompreensível, sendo a COP26 um encontro que reuniu 120 líderes globais, incluindo alguns inicialmente relutantes em participar, como o indiano Narendra Modi.
A correspondente brasileira Cláudia Wallin, que colabora com o MediaTalks a partir da Suécia, contou que a notícia apareceu no principal telejornal rede pública, equivalente à BBC, com a crítica: “Em vez de ir a Glasgow, Bolsonaro viajou para Anguillara Veneta para se tornar cidadão honorário”.
Os abalos não vieram só de Glasgow. A agressão a jornalistas na visita do presidente à Itália exibiu ao mundo uma truculência assustadora.
Brasil ou governo do Brasil?
Não é a primeira vez que o País enfrenta cobertura negativa capaz de arranhar sua imagem externa.
Mas há agora uma uma diferença sutil. A generalização de país desorganizado ou pouco sério parece estar dando lugar a uma outra impressão: a de que o Brasil é uma coisa e atual governo é outra.
Pode ser pensamento mágico, um desejo de que a instituição Brasil não seja tão atingida.
Mas alguns fatos ajudam a acreditar na ideia. Reportagens sobre o caso da Itália apresentaram o presidente como figura isolada. A da Reuters é um exemplo: “O ex-capitão do Exército viu seu apoio internacional diminuir desde que Donald Trump perdeu sua candidatura à reeleição, enquanto o ceticismo de Bolsonaro em relação à Covid-19, vacinas e questões ambientais lhe rendeu poucos amigos no cenário global”.
Na cobertura da COP26, a separação entre passado e presente tem sido constante.
Em um artigo explicando a questão do desmatamento produzido pelo The Guardian e compartilhado pelos integrantes da coalizão Covering Climate Now (incluindo o MediaTalks), elaborado com ajuda de um grupo de cientistas, a política ambiental do País é assim descrita: “O Brasil teve sucesso considerável na redução do desmatamento na Amazônia no final dos anos 2000 e início dos anos 2010. No entanto, desde então houve grandes picos de desmatamento na maior floresta tropical do mundo sob a presidência de Jair Bolsonaro”.
No dia abertura da conferência, Mary Robinson, ex-presidente da Irlanda, autora do livro Justiça Climática (publicado em português) falou à Sky News sobre a decepção com a participação do Brasil na COP26.
Entretanto, fez a ressalva de era um momento infeliz, citando o nome da ex-ministra Isabela Teixeira como exemplo de ocupante de cargo público que contribuiu para mitigar os problemas em sua gestão.
Só que esses lampejos podem não ser suficientes para compensar a avalanche de cobertura negativa. Quase todas as matérias sobre o acordo do desmatamento salientaram que ele estava sendo assinado “inclusive pelo Brasil”, inferindo surpresa diante do histórico nada abonador.
Por mais que diplomatas e empresários se empenhem para desconstruir a má reputação do País, a questão da Amazônia tem um peso difícil de equilibrar, quando um nome como Al Gore diz que não confia no presidente Bolsonaro e em seus compromissos.
No Reino Unido, o massacre diário tem hora certa para acontecer. Patrocinadora da cúpula, a SkyNews criou um “estúdio ao ar livre” em Manaus, de onde o jornalista Mike Stone coancora diariamente o principal noticiário da rede.
Da beira do rio ele entrevista pessoas comuns, cientistas, líderes indígenas e de ONGs, unânimes em condenar a condução governamental.
Se serve de consolo, pelo menos mostra ao mundo vozes sensatas, com argumentos baseados na ciência e não na política.
Em outubro, a consultoria Brand Finance revelou em seu estudo Nation Brands que o Brasil perdeu 12% do valor de sua marca nacional em 2021, devido sobretudo à resposta falha à Covid-19.
Diante da onda de críticas, só resta torcer para que a percepção de que uma coisa é o governo e outra coisa é o País ajude a suavizar o que nos espera depois da COP26.
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