Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Embates como os da semana passada entre a BBC e o comentarista esportivo Gary Lineker, suspenso por um tuíte, acontecem com mais frequência do que se imagina, colocando em lados opostos empregadores e profissionais por conta de posts em contas pessoais.

Mas nem todos recebem a atenção de um caso envolvendo uma das maiores empresas de mídia do mundo e uma celebridade com quase 9 milhões de seguidores no Twitter.

As mídias digitais são relativamente novas, e os padrões para seu uso ainda não estão totalmente definidos.

No jornalismo as regras são mais claras, sob a ótica de que profissionais de imprensa são identificados com as empresas de mídia para as quais trabalham. Suas posições pessoais podem colocar em risco a percepção de imparcialidade.

A professora e pesquisadora britânica Kelly Fincham, da Universidade de Galway, na Irlanda, fez uma pesquisa sobre as políticas de empresas jornalísticas como a própria BBC e outras como ESPN, NPR e Guardian. Há linhas comuns, como o entendimento de que retuíte pode ser interpretado como endosso.

Fora do jornalismo os limites são mais difusos. Um exemplo é uma pesquisa divulgada esta semana pelo instituto YouGov, revelando o desconforto dos britânicos com empregadores bisbilhotando o que postam.

Mais da metade (53%) dos entrevistados discordam em teoria que empresas peçam para verificar contas pessoais nas redes em processos seletivos. Somente 32% aceitam a prática.

Há exceções, como em contratações para posições que envolvam cuidados com crianças ou pessoas vulneráveis. Nesses casos, 64% acreditam que é uma atitude correta.

Pedir o mesmo a candidatos a cargos executivos como CEO é aceitável para a metade dos entrevistados.

Mas quando a pergunta é sobre se aceitariam compartilhar suas próprias contas como condição para conseguir um emprego, a resistência é maior.

Quatro em cada dez britânicos (39%) não estariam dispostos a mostrar seus perfis a um possível empregador, incluindo 22% que dizem que  “relutariam muito” em fazê-lo.

Tecnicamente, as empresas ou headhunters não precisariam pedir autorização, a não ser em casos de perfis fechados. No entanto, a pesquisa indica que o ato de verificar o que um indivíduo posta em suas redes não é bem aceito pela maioria.

Assim como quase tudo que envolve tecnologia, as opiniões mudam com a faixa etária. Metade dos entrevistados com idade entre 18 e 24 anos não veem problema em indicar suas contas. Apenas 25% de pessoas acima de 55 anos pensam o mesmo.

Talvez temerosas de afastar bons candidatos em um mercado de trabalho afetado pelo êxodo de profissionais depois do Brexit, as empresas britânicas parecem estar cuidadosas − ou muitas estão bisbilhotando sem avisar.

O estudo do YouGov constatou que somente 5% dos entrevistados receberam pedidos para divulgar suas redes em processos seletivos. De novo, os jovens foram os mais demandados: 6% deles admitiram ter recebido a solicitação, contra apenas 1% entre pessoas acima de 55 anos.

Um em cada seis entrevistados com menos de 24 anos acredita que foi rejeitado em um emprego ou promoção por suas postagens nas redes. E Lineker não está sozinho no bloco dos que levam puxão de orelhas dos empregadores pelo que postam: 5% dos britânicos declararam ter vivido a mesma situação, percentual que sobe para 14% entre os abaixo de 24 anos.

O risco de má percepção por parte de empregadores não vem apenas do que se posta na atualidade. Pode vir também de algo feito com a melhor das intenções: o sharenting. Pais que publicam fotos de seus pequenos em situações constrangedoras, como pirraças, podem criar problemas para eles no futuro.

Na França, um projeto de lei proibindo o sharenting tramita no Senado, estabelecendo regras para que os pais sejam impedidos por um juiz de família de postar imagens dos filhos, caso sejam consideradas excessivas ou prejudiciais.

Esses não vão ter que se preocupar com situações ridículas no futuro, que podem não causar a perda de uma vaga, mas são capazes de gerar oportunidades para bullying.


Para receber as notícias de MediaTalks em sua caixa postal ou se deixou de receber nossos comunicados, envie-nos um e-mail para incluir ou reativar seu endereço.

0 0 votes
Article Rating
Subscribe
Notify of
guest
0 Comentários
Inline Feedbacks
View all comments