Hélio Doyle, professor aposentado da UnB, e a filha Luísa Doyle
Tenho um filho e três filhas, e apenas uma delas, Luísa, optou pelo jornalismo. Ela simplesmente me avisou que faria Jornalismo na Universidade de Brasília, onde eu era professor. Em nenhum momento eu havia tentado convencê-la a seguir a carreira do pai, mesmo achando que o jornalismo é mesmo a melhor profissão do mundo, como escreveu Gabriel García Márquez.
Luísa está na profissão há 14 anos, 12 dos quais como repórter da Rede Globo em Brasília. Ela vive uma experiência que não tive. Em 52 anos de jornalismo, nunca fui repórter de televisão, a não ser ocasionalmente − eu era chefe de Redação na Globo em Brasília, e meu trabalho era coordenar e editar. Apareci na tela por apenas duas semanas, cobrindo eleições na Alemanha.
Gosto muito do trabalho da Luísa, não com a visão de pai coruja, mas de colega mais experiente e de ex-professor dela na UnB. Dou palpites e sugestões, manifesto aprovação ou desaprovação quanto à forma e ao conteúdo de suas reportagens. Em condições normais, diria que tem futuro. Confesso, porém, que a nova realidade do jornalismo me preocupa: grande número de desempregados, empresas em dificuldades ou desaparecendo, salários mais baixos, muitos sobrevivendo com dificuldades. Bem diferente de quando eu tinha a idade dela.
Mas, o que Luísa pensa sobre tudo isso? Perguntei a ela.
− Como foi a sua opção pelo jornalismo? Tive alguma influência?
Quando eu era menor, dizia que nunca iria querer fazer Jornalismo porque você trabalhava muito. Mas aí, no ensino médio, percebi que gostava de escrever. Redação era uma das minhas aulas preferidas. Então comecei a pensar em Jornalismo. Tinha outras faculdades como opção, como Psicologia e Relações Internacionais. Mas acabei optando pelo Jornalismo pela vontade de escrever, de contar histórias, de ouvir pessoas. Com certeza teve influência sua, de alguma forma.
− E aí deixou de lado o fato de eu trabalhar muito, ser muito ausente?
Deixei. Nunca te achei um pai ausente. Não deixava de estar nos momentos importantes, sempre brincava com a gente, levava no parque. Minha lembrança é de você chegar em casa muito tarde durante a semana. Mas isso acabou não pesando na decisão.
− Em algum momento se arrependeu?
Não, nunca. É uma profissão que nem sempre é fácil, é cada vez menos valorizada. Mas, ainda assim, não me imagino fazendo outra coisa.
− Você passou por meio impresso e está na televisão. Qual prefere?
Passei pelo online também. São bem diferentes e gostei de trabalhar nos três. Mas a televisão me encantou desde o primeiro estágio, na Band, depois ainda mais quando estagiei na Globo. Pelo dinamismo, pelo grande alcance que tem. Hoje em dia o online cumpre muito esse papel também, mas a TV é o agora. O ao vivo. O que está acontecendo naquele momento. Sempre gostei de estar em um lugar na hora do fato e já mostrar isso para as pessoas. E é muito bom ver como isso repercute na vida da população, como uma reportagem pode mudar a vida de alguém.
− Vendo demissões, veículos fechando, colegas desempregados, você não teme pelo futuro na profissão?
Temo. Acho que é um momento delicado e de transformação do jornalismo. Não sei como estaremos daqui a dez anos. Não acredito que a profissão irá acabar, mas vai se transformar profundamente. Os veículos, as formas de linguagem, a dinâmica, tudo já tem sido e vai ser ainda mais diferente. Cabe a nós nos adaptarmos.
− Mesmo assim não pensa em alternativas?
Hoje, não penso.
− Você está em telejornais locais e de vez em quando faz matérias políticas ou econômicas para telejornais da rede e para a GloboNews. Em que área se sente mais à vontade?
É interessante mudar de ares, fazer coberturas diferentes. Isso é uma das coisas que mais me atrai no jornalismo. As matérias políticas e econômicas são um grande aprendizado e uma grande responsabilidade. São questões importantes. Mas a cobertura local é importantíssima também. Somos os porta-vozes da população, muitas vezes a única chance de as pessoas serem ouvidas sobre problemas das suas comunidades. E uma matéria ou um link pode ter um impacto gigantesco. Uma rua sem energia passa a ter luz, uma pessoa sem atendimento consegue finalmente ver um médico, um bebê que pode morrer por problemas cardíacos passa por cirurgia e tem uma chance de viver. Tudo graças à pressão que fazemos. Eu me identifico muito com o jornalismo local.
− Você fala três línguas e arranha mais uma. Tem vontade de, um dia, ser correspondente internacional?
Seria uma experiência muito boa, sem dúvida. Deve ser incrível ter a oportunidade de trabalhar em outro país, cobrindo questões tão diferentes das nossas, conhecendo pessoas e lugares.
− O que é bom e o que é ruim no jornalismo?
Bom é o dinamismo. Não ter rotina. Cobrir diferentes assuntos, conhecer pessoas e lugares que eu jamais conheceria. Cada dia é uma nova experiência. Também é muito bom saber que fazemos diferença na vida das pessoas. Que podemos ajudar, informar, melhorar o dia, a vida de alguém. Ruim é a desvalorização da profissão. E a falta de respeito com o nosso trabalho, maior nos últimos anos. Principalmente as inadmissíveis agressões − verbais ou físicas − a profissionais.