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segunda-feira, novembro 25, 2024

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Memórias da Redação ? O foca

Plinio Vicente da Silva ([email protected]), colaborador assíduo deste espaço, manda de Roraima uma homenagem a Zequinha Neto, falecido no último mês de outubro, aos 53 anos. O foca Ainda sobre a morte, aqui em Boa Vista, do jornalista José Aparecido da Silva, o Zequinha Neto. Nascido em Socorro e criado em Jundiaí, ambas no interior de São Paulo, trocou a Terra da Uva por Roraima, onde veio ser correspondente do Estadão, JT e Agência Estado e mais tarde professor da Universidade Federal. Companheiro e amigo leal de muitas décadas, não tive a oportunidade de prestar-lhe uma homenagem, mesmo que post mortem, o que faço neste texto simples, ainda que tardio. Nos meados dos anos 70 do século passado circulava em Jundiaí pelas mãos de Sandro Vaia, Ademir Fernandes (já falecido) e Sergio ?Serron? Rondino, o tablóide semanário Jornal de 2ª. De linha editorial agressiva, mandava o cacete no então prefeito, Íbis Cruz. Tanto bateu que ele acabou cassado. Com justiça, pois o alcaide carregava nas costas um monte de acusações, a maioria por corrupção. Repórter iniciante, Zequinha Neto, pelos testemunhos da época, revelou-se já nos primeiros dias um foca desses que nenhum chefe gosta de receber para adestramento, como contam os fatos que descrevo aqui. A edição fechava na noite de quinta-feira, rodava na sexta e era distribuída no final de semana. Esse fluxograma dava à redação todo o tempo necessário para montar boas matérias. Numa dessas quintas-feiras, já no meio da tarde, Zequinha foi ao estádio Jaime Cintra cobrir o treino do Paulista, principal time de futebol da cidade. Para sua surpresa os jogadores estavam todos sentados do lado de fora do campo, nas arquibancadas, conversando. Iniciante, ainda tímido, perguntou a um deles se o treino já tinha acabado. A resposta foi de que não houve treino. Motivo: o elenco estava em greve por falta de pagamento dos salários. Zequinha parou, pensou e concluiu: ?Putz! O que eu faço agora? Vou voltar pro jornal sem material. O Ademir vai me arrancar o couro…?. Voltou, ficou por ali caçando mosca até que lá pelas cinco da tarde, Ademir, o fechador, vendo que o foca não tirava o traseiro da cadeira, gritou: ? Zequinha, cadê a matéria do Paulista? Você não foi cobrir o treino? Ele se levantou, foi até a mesa do chefe, estufou o peito e mandou: ? Não tem matéria. ? E por quê não tem matéria? ? Porque o time não treinou. Risonho como sempre, semblante que mantinha mesmo diante das situações mais difíceis, Ademir segurou o ombro de Zequinha, colocou-o contra a parede e, sem deixar morrer o sorriso, esgoelou, para satisfação de todos os que já esperavam pelo desfecho e assistiam divertidos toda aquela cena: ? E por quê não houve treino? ­          ? Os jogadores disseram que não iam treinar porque o pagamento dos salários está atrasado há três meses. Depois de toda a cena, ilustrada por uma encenação que os colegas mais velhos já conheciam de sobra, Ademir soltou Zequinha, voltou-se para o Sandro, que já não conseguia ver aquilo com a seriedade que deveria mostrar o dono do jornal, e perguntou-lhe: ? E agora, Sandrão? O que vamos fazer? Se quisermos publicar matéria do Paulista nesta edição vamos ter que entrevistar o foca… No começo deste ano, quando fui fazer uma palestra para os alunos de Jornalismo do Zequinha na UFRR, lembrei desse episódio. Quando estava quase concluindo ele me aparteou, olhou para a classe e sentenciou: ? Jamais sintam vergonha de errar. A primeira coisa que aprendi ao passar por essa experiência foi: quando um fato subsequente, imprevisto, impede que o anterior aconteça, ele passa a ser a matéria. Para ilustrar melhor, Zequinha lembrou a história do repórter enviado a uma cidade do interior para cobrir a visita do presidente da República, que fora inaugurar uma obra. Lá pelas 8 da noite, à beira do deadline, e sem a matéria do cara, o editor ligou para o hotel e conseguiu falar com o repórter: ? Cara! Cadê a matéria sobre a visita do homem? ? Olha, chefe, não teve inauguração e, portanto, não tem matéria. O prédio pegou fogo e o presidente voltou para Brasília. Foi mais ou menos grave, morreram apenas dois trabalhadores da limpeza, mas o presidente e a comitiva toda saíram ilesos… Para encerrar: apesar da bronca, Ademir acabou entrevistando o foca e o Jornal de 2ª daquela semana saiu com uma bela matéria sobre a greve dos jogadores do Paulista e o treino que não houve. O suficiente para que Zequinha sobrevivesse na profissão e para que, no futuro, ele se tornasse um exigente amestrador de focas aqui em Roraima.

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