A história desta semana é uma colaboração de Guilherme Meirelles ([email protected]), estreante no espaço. Colaborador do Valor Econômico para revistas e suplementos, também faz frilas para a revista ELO (da Sotreq), Mundo Corporativo (Deloitte), Bares&Restaurantes (Abrasel), entre outras. Já trabalhou em Folha de S.Paulo, Folha da Tarde e Agência Estado. É pós-graduando em Jornalismo pela Cásper Líbero. Impressões sobre uma entrevista “Essa é para matar paulista de inveja”. Durante duas horas, ouvi esta frase pelo menos quatro vezes, sempre de forma irreverente e provocativa e com um indisfarçável tom de orgulho. Acomodado em uma mesa debaixo de uma exuberante figueira em um conhecido restaurante dos Jardins, zona nobre de São Paulo, eu ouvia atentamente as ecoproezas do grupo EBX no campo da sustentabilidade. Simpático e extrovertido, o diretor do grupo empenhava-se animadamente em relatar ao atento repórter os milionários investimentos do arrojado empresário Eike Batista em iniciativas de conservação ambiental no Pantanal, Fernando de Noronha e nos Lençóis Maranhenses. Ideias sempre de “matar paulista de inveja”, ressaltando que o autor da expressão era o seu patrão, que a usava em reuniões e entrevistas quando queria destacar a grandiosidade e o profissionalismo de seus projetos. Aliás, é com “ei” ou com “ai”? Foi a primeira pergunta que fiz naquela ensolarada tarde de primavera ao diretor e aos dois assessores, que aguardavam a minha chegada na companhia de petiscos e doses de uísque. “É Aike”, me disse, dissipando uma dúvida recorrente em muitas conversas com colegas e amigos e que me foi de grande valia nos encontros futuros em que o nome do empresário aparecia. Era para ser uma entrevista por telefone. O convite para o almoço partiu do próprio diretor, que “coincidentemente” estaria em São Paulo durante a semana. Perguntou se eu conhecia o afamado restaurante. Disse que apenas de nome e antes de aceitar o convite consultei minha editora, já que seria meu primeiro trabalho como free-lancer para a empresa. De cara, recebi um generoso press kit que, além das informações institucionais, continha um DVD chapa-branca sobre a trajetória do ex-ministro Eliezer Batista, pai do empresário, contada de tal forma que constrangeria até mesmo os defensores do grupo Procure Saber. Recebi também um luxuoso livro de capa dura a respeito do projeto “Lagoa Limpa”, que destacava o milionário projeto do empresário em despoluir a lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio. Confesso que nunca li o livro. Meses depois, troquei-o em um sebo por O passado, do argentino Alan Pauls, e por O que é o virtual, de Pierre Levy. Espero não ter feito um mau negócio, caso o livro vá na direção contrária das ações das empresas do grupo EBX na Bolsa e passe a valer uma fábula em alguns anos. Admito que fiquei até bem impressionado com as medidas ambientais adotadas pelo grupo. Embora os valores passados fossem até expressivos, confesso que fiquei frustrado. Eram abaixo daqueles que eu imaginava para projetos de “matar paulista de inveja”, ainda mais partindo de um dos homens mais ricos do mundo. Para compor a reportagem, chequei as informações com as ONGs envolvidas nos projetos e não houve ninguém que desabonasse as boas intenções do grupo. Entre uma garfada e outra, o nome do chairman era constantemente mencionado pelo diretor e o tornava indissociável do grupo EBX, como se estivéssemos falando de Silvio Santos e o SBT. Separei uma frase para entrar na abertura da matéria: “Uma empresa do século 21 precisa ter a questão da sustentabilidade em seu DNA. Não dá para trabalhar como no século passado, apenas em torno de metas e doações”. Assim como não economizaram em autoelogios e em gentilezas, a conta do almoço certamente ficou em valores muito acima dos que eu teria condições de dispender, apesar de meu modesto pedido (para os padrões da casa) como prato principal e de ter permanecido incólume na água mineral. Despedimo-nos e nunca mais mantivemos contato. No primeiro semestre de 2013, quando os primeiros sinais da crise se manifestaram, soube pelos jornais que a diretoria de sustentabilidade havia sido extinta e que toda a equipe fora demitida. O resto é aquilo que todos já sabem. E, hoje, por ironia, o nome do livro do autor argentino trocado no sebo serve como epíteto para aquele que um dia foi aclamado pela mídia e por políticos como o novo fenômeno da economia mundial.