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sábado, dezembro 21, 2024

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Reportagem do Estadão reconstitui Guerra do Contestado

No último domingo (12/2), o Estadão publicou a reportagem especial Meninos do Contestado, sobre o conflito armado que tomou parte do Sul do País entre 1912 e 1916. A Guerra do Contestado colocou de um lado a população cabocla e pobre e, do outro, o governo, deixando marcas profundas e ainda visíveis na região.

Foi atrás desses relatos (e de testemunhas vivas do período) que se aventurou a dupla Leonencio Nossa e Celso Júnior (fotógrafo), da sucursal de Brasília do jornal. Parceiros de outras empreitadas, os repórteres já produziram, entre outros, o caderno especial Guerras Esquecidas do Brasil, que ganhou diversos prêmios, incluindo dois internacionais.

Leonencio também trabalhou numa reportagem especial que reviu documentos da Guerrilha do Araguaia, que pretende publicar em livro ainda este ano. Para Cida Damasco, editora-chefe do Estadão, “o caderno já nasceu como um projeto multimídia. Foi quase uma continuação natural do trabalho Guerras Desconhecidas, publicado no final de 2010”. Segundo ela, a apuração levou um ano, sendo três meses somente na região do conflito. “Por si só, isso já comprova, mais do que apoio, o forte engajamento da redação, a começar da sucursal de Brasília”, relata.

Jornalistas&Cia – Quais foram as maiores dificuldades enfrentadas durante a reportagem?

Leonencio Nossa – Foi um trabalho de longo tempo, mais ou menos um ano. Foram cem dias de pesquisa de campo. Antes, fizemos uma coleta de documentos. Nosso principal desafio era confrontar os fatos com a bibliografia que já existia no Sul, e procurar por novos fatos, que pudessem realmente informar o que ainda não havia sido contado. Quando chegamos aos arquivos do Exército, por exemplo, eram muitos documentos, cerca de dois mil, e tivemos que verificar cada um e registrá-los. Era a versão oficial que tínhamos, mas precisávamos do outro lado. Para isso, tínhamos que localizar pessoas vivas para nos contar. E a região pesquisada figura entre os piores IDH do Sul do Brasil, com expectativa de vida muito baixa. Incrivelmente diferente da Santa Catarina mais conhecida, a região [onde ocorreu a guerra] é composta de 40% de população pobre e indigente. Constatamos, no trabalho, que a guerra de tantos anos ainda não foi resolvida, isolando a região como uma ilha de pobreza bem no Sul do País. Nos concentramos na infância para contar a sua história, já que não tínhamos os relatos de combatentes, já falecidos. Mas a reconstrução da história era frágil.

J&Cia – Como vocês se programaram para fazer a reportagem ao longo do ano?

Leonencio – Não dá para parar o dia a dia e se dedicar a um só assunto, então o jeito é conciliar com o trabalho que temos que fazer. Começamos com o ofício da pesquisa, que leva muito tempo para reunir toda a bibliografia e consulta no Exército. Depois reunimos em arquivo o que interessava do ponto de vista jornalístico e saímos em campo para confrontar os dados. Em seguida, produzimos relatórios e juntamos com a parte militar, só aí pudemos condensar todo o material. Foi trabalhoso.

J&Cia – Como foi encontrar três velhinhos centenários nessa história?

Leonencio – Eram pessoas de 102, 105 e 108 anos, muito lúcidas. Duas senhoras fisicamente perfeitas, e um senhor numa cadeira de rodas, que fala com dificuldade, mas que nos deu o mais forte depoimento, pois perdeu o pai durante a guerra.

Celso Júnior – Quando partimos para a região, nem no pensamento mais otimista imaginávamos que encontraríamos três personagens com mais de 100 anos. A dificuldade de fotografar, principalmente o sr. Atino, foi muito grande. Tive que respeitar o espaço dele e esperar o momento dele. Mas eles eram lúcidos e nos deram um relato em que transpareceu todo o sofrimento que tiveram com a guerra, sofrimento que os acompanha até hoje.

J&Cia – E a ideia de pedir ajuda às rádios e aos jornais da região, inclusive a serviços de alto-falante, para encontrar sobreviventes do período? Como foram essas negociações?

Leonencio – Quanto mais pessoas ajudando, melhor. E fomos encontrar colegas de profissão nessa luta. A rádio é um veículo fantástico de comunicação, além de blogs e pequenos jornais. O que me chamou a atenção foi que no final das contas muitos nos disseram que tinham vergonha de contar essa parte da história, e precisaram da iniciativa de um veículo de fora para aumentar sua autoestima. Divido com aqueles profissionais os méritos pelo reconhecimento desse trabalho.

J&Cia – O trabalho limitou-se ao que foi publicado?

Celso – Produzi um grande material fotográfico na reportagem. Passei dias e dias na edição das fotografias e cerca de um mês numa ilha de edição, montando um documentário de 16 minutos, Meninos do Contestado. Há depoimentos, fotos, narração… Está tudo disponível no portal do Estadão.

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