Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

O grupo ambientalista Extinction Rebellion (XR), que se notabilizou por manifestações disruptivas na defesa do clima, assustou o Reino Unido com a promessa de quatro dias de protestos para marcar o Dia da Terra.

Mas o que se viu foi algo diferente, sinalizando uma mudança de estratégia que dá pistas sobre o futuro do ativismo climático.

O chamado “The Big One” – uma ação de quatro dias (de 21 a 24/4), em que pessoas de todos os grupos e movimentos, não apenas do XR, se reuniram em Westminster e nas Casas do Parlamento britânico − foi grande em vários sentidos.

The Big One

A decisão do grupo de abandonar atos como atacar obras de arte em museus e fechar ruas e pontes fez com que famílias com crianças e pessoas que não tinham vontade de ser presas aderissem às manifestações e declarassem apoio.

A nova estratégia refletiu-se na mídia. Notícias negativas sobre problemas causados à população e ao patrimônio deram lugar a debates e testemunhos serenos.

É uma transformação radical no modus operandi do movimento de mais visibilidade atualmente, superando “gigantes” como o Greenpeace − que já foi vítima de ataques do XR.

Pode ser que não dure, caso o grupo julgue que não surtiu efeito. Porém, demonstra um pé na realidade, uma espécie de realpolitik do ativismo ambiental.

Nascido em Londres em 2018, o XR define-se como “um movimento internacional que usa a desobediência civil não violenta na tentativa de deter a extinção em massa e minimizar o risco de colapso social”.

Na primeira manifestação, o grupo colocou em prática um estilo midiático de cobrar soluções para as mudanças climáticas, lembrando o Greenpeace. Adotou elementos visuais, como fantasias lembrando Carnaval, e criou o famoso barco rosa com a frase “Tell the Truth”.

Um ato em Londres em abril de 2019 marcou o estilo de protesto do XR. Ativistas quebraram vidros da sede da Shell e fecharam ruas e uma da principais pontes da cidade.

Uma das curiosidades do grupo é o convite a apoiadores que estejam dispostos a ser presos. Cenas da polícia tentando arrancar manifestantes colados a grades ou ao asfalto ou carregando senhores que estavam deitados no meio da rua viralizaram, tentando construir a ideia de que o sacrifício é válido pela defesa do planeta.

Nem a pandemia, que dificultou manifestações, esfriou a disposição do XR. Em setembro de 2020, um dos alvos foi o jornalismo. Manifestantes bloquearam a distribuição de jornais, o que foi interpretado como violação da liberdade de imprensa.

Em 2022, a temperatura subiu mais. Duas extensões radicais do XR, o Insulate Britain e o Just Stop Oil, danificaram obras de artes e causaram o terror no Reino Unido.

Cenas exibidas na TV como a de uma mulher que precisava levar uma pessoa ao hospital implorando pela abertura de uma rua bloqueada podem ter agradado aos mais radicais. Para a maioria, mesmo aqueles que se preocupam com as mudanças climáticas, não ajudaram a angariar simpatia, como apontaram pesquisas.

Segundo o acompanhamento do instituto YouGov, o grupo é conhecido por 73% da população britânica, mas admirado apenas por 16%.

Ao mesmo tempo em que a falta de aprovação popular pode ter começado a preocupar, um projeto de lei apresentado no Parlamento para endurecer a repressão de protestos deve ter contribuído para a declaração do XR no primeiro dia de 2023: “We quit”.

Não foi uma desistência da causa, e sim uma reorientação da forma de pressionar. O Big One exibiu pela primeira vez a nova face do Extinction Rebellion. Uma face simpática, capaz de se mostrar mais eficiente do que um punhado de extremistas adotando a tática do medo.

Essa gente que foi ou assistiu aos atos mais pacíficos deste fim de semana pode se engajar mais facilmente em manifestações, pressionar empresas e o poder público. Pode também ser convencida a fazer escolhas mais sustentáveis, afetando hábitos de consumo e marcas individuais.

Alianças importantes começam a surgir. Mais de 100 advogados renomados assinaram no fim de março uma Declaração de Consciência comprometendo-se a não processar manifestantes ou movimentos.

Os protestos violentos fizeram barulho e projetaram o XR, mas na prática não causaram transformação. Tentar uma nova estratégia é um movimento sábio para quem quer mais do que publicidade.


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