Por Luciana Gurgel

Luciana Gurgel

Em situações sensíveis como a crise do Afeganistão um passo em falso pode virar um desastre de relações públicas de escala planetária. Ou alçar ao panteão dos heróis da causa aqueles que fazem o movimento correto na hora certa.

A última semana proporcionou exemplos de erros e acertos envolvendo celebridades.

De um lado, a supermodelo e atriz britânica Lily Cole, que abusou da insensibilidade ao publicar no Instagram fotos usando a burca. De outro, a atriz Angelina Jolie, que fez jus ao histórico de engajamento em questões sociais para estrear em grande estilo na plataforma.

Em comum, apenas o uso do Instagram. Mas foi diametralmente oposta a forma que cada uma escolheu para associar-se aos acontecimentos no Afeganistão pela rede social.

Quando as tropas do Taliban já chegavam a Cabul e crescia o temor pelo fim da liberdade das mulheres no país prestes a voltar ao domínio da lei islâmica Sharia, Lily Cole postou duas fotos vestindo o traje que se tornou símbolo de opressão.

Poderia ter sido um manifesto, mas não foi. A intenção era promover seu novo livro sobre mudanças climáticas, com o convite “vamos abraçar a diversidade em todos os níveis”.

Mesmo que a postagem não tenha tido intenção de pegar carona em um tema em evidência para uma ação de marketing, foi desastrosa por não levar em conta os riscos de reação negativa.

O mais impressionante, porém, foi a lentidão da resposta. Cole levou quatro dias para se desculpar. E, ao fazê-lo, disse que “seu coração se partiu ao ler sobre o que estava acontecendo no Afeganistão”.

A não ser que estivesse vivendo em Marte, é difícil crer que não soubesse o que se passava no país, com a imprensa e as redes sociais falando exaustivamente sobre as projeções sombrias para as afegãs.

Também é surpreendente que tal erro tenha sido cometido por Cole. Diferentemente de muitas modelos que deixam os estudos para seguir carreira, ela graduou-se em História da Arte pela Universidade de Cambridge em 2011. É ativista de causas ambientais.

Conhecimento não lhe falta, nem maturidade, pois tem 33 anos. Mas faltou bom-senso. E talvez um bom assessor de comunicação.

Ela até tentou remediar, postando conteúdo de apoio a mulheres afegãs. Mas não vai ser fácil consertar o estrago.

Legitimidade

Já Angelina Jolie acertou a mão.

Era uma das poucas celebridades globais fora do Instagram. O momento de estrear na rede social tão associada a moda, glamour e culto a personalidades foi coerente com as atitudes da atriz, embaixadora da Boa Vontade da Agência de Refugiados da ONU.

A forma também foi irretocável. Ao postar a carta recebida de uma jovem afegã, Jolie disse estar usando seu espaço para dar voz aos que foram impedidos pelo Taleban de se manifestarem pelas redes sociais.

A mensagem incorporou um dos principais elementos de sucesso em comunicação, senão o principal: legitimidade.

A atriz falou de suas impressões ao visitar o Afeganistão duas semanas antes do ataque àsTorres Gêmeas, quando conversou com pessoas submetidas ao rigor do Taleban. Nada mais convincente do que a experiência pessoal.

A aprovação foi quase unânime. Uma das poucas a questionar o ato foi a escritora paquistanesa Fatima Bhutto, que classificou a tomada de posição da atriz como “hipocrisia”, por não incluir também as palestinas e as mulheres oprimidas da Cachemira.

Mas a percepção positiva foi esmagadora. A conta passou de nove milhões de seguidores em três dias. O post inaugural teve mais de 3,6 milhões de likes. Entre os que comentaram estão fãs anônimos e entidades como a Anistia Internacional.

O post seguinte de Angelina Jolie foi sobre o drama dos migrantes obrigados a deixar o local onde vivem devido a conflitos, com referência à situação da Etiópia.

Sinal de que a conta não vai mesmo ser um canal para saber sobre o batom da moda ou a grife usada em uma festa. E vai consolidar a imagem da atriz como uma das que usa sua popularidade para ajudar a melhorar o mundo.

Uma aula de RP de verdade, em todos os sentidos.


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