Por Assis Ângelo

Essa história de juntar uma coisa com outra, no caso aí uma cabeça com o corpo de pessoas diferentes, é algo, na realidade, impensável. Na ficção, porém, tudo é possível. Na ficção, eu disse.

Claro que na medicina a ficção parece estar se tornando realidade.

Há casos confirmados dando conta de que humanos já têm substituído braços e pernas mecânicos. Até cabeças humanas já tentaram e continuam tentando transplantar de um corpo para outro. Com chips e tudo mais.

RoboCop é um personagem meio humano, meio máquina, que ganhou repercussão internacional na TV e no cinema.

Num campo mais amplo, além da Terra, há muito se cogita a existência de seres chamados, grosso modo, ETs, Ovnis…

Há muitos estudos sobre o assunto desde tempos imemoriais.

Não é de hoje que todo mundo diz que os gringos norte-americanos sabem muito mais do que nós, pobres mortais, nem sonhamos saber, pelo menos no campo científico e tal.

Sobre esse assunto, existe um seriado chamado Arquivo X (1993).

O suíço caçador de mistérios interplanetários Erich von Däniken, autor do best-seller Eram os Deuses Astronautas?, disse acreditar piamente na existência de seres vivos espalhados galáxias mundo afora. Eu o entrevistei. Disse ele que não estamos sós no Espaço. Hummm…

Em nome da ciência, muita bobagem tem sido feita, inclusive no que tem a ver com sacanagem.

Em junho de 1903, o escritor taubateano Monteiro Lobato (1882-1948), sob o pseudônimo Lobatoyewscky, escreveu um conto a que intitulou Rubis.

Monteiro Lobato

Nesse texto, Rubis são os biquinhos do peito de uma virgem, durinhos. O personagem Paulo dialoga com a prima Lúcia, convencendo-a a mostrar, em nome da ciência, seus peitinhos duros e lindinhos.

Na sua doçura adolescente, Lúcia cai na onda do seu primo e mostra tudo o que ele quer ver e apalpar. No momento X chega a vovó quase cega de Lúcia. E espantada pergunta: “Minha filha! Tudo bem!?”.

Uma coisa puxa outra.

Pois, pois: no decorrer da sua existência, Coelho Neto abordou temas sobre homossexualidade e tal. Provocou polêmica. E muita.

No conto O Patinho Torto, ele faz ligação inversa do que fez Christian Andersen (1805-1875) com O Patinho Feio.

Na sua história, Neto conta que uma mulher deu à luz a uma criança no mesmo dia em que morria o seu marido. A mulher entrou em parafuso, em depressão, quase ficando doida. A criança foi crescendo, crescendo pelas mãos de uma babá que aos poucos ia transformando o seu comportamento de menino numa menina, como desejava a mãe.

A mãe do menino queria uma menina, mas deu zebra. E aí…

Essa história ganhou formato impresso em 1924. Quatro décadas depois foi encenada pela primeira vez, em outubro de 1964, no Teatro Nacional de Comédia, RJ. E, em 2001, ganhou espaço na série Brava Gente (Globo).

Como jornalista, Coelho Neto começou a carreira num jornal de José do Patrocínio, de quem se tornou amigo. Usou muitos pseudônimos, entre os quais Anselmo Ribas, Caliban, Ariel, Democ, N. Puck, Tartarin, Fur-Fur e Manés.

Em 1923, Coelho Neto conheceu o escritor português Júlio Dantas (1876-1962).

Júlio Dantas

Neto e Dantas tornaram-se amigos de infância.

Dantas é autor do interessantíssimo livro A Conquista.

Os personagens que transitam nas páginas desse livro são reais, denominados, porém, por nomes como Anselmo Ribas, Rui Vaz, Paulo Neiva e Octávio Bivar, respectivamente, Coelho Neto, Aluísio Azevedo, Paula Ney e Olavo Bilac.

O título do livro é uma referência à vitória dos abolicionistas.

Casado, Coelho Neto foi pai 14 vezes.

Também por 14 vezes foi pai o poeta simbolista de Minas Alphonsus de Guimarães.

Os poemas de Alphonsus tratam de religião, amor e morte. Seu personagem mais conhecido é Constança, dedicado a uma prima por quem se apaixonara e que morrera aos 17 anos de idade.

Alphonsus era casado com uma filha do romancista Bernardo Guimarães, autor do livro A Escrava Isaura.

A história em todos os tempos é longa e a tendência é se alongar cada vez mais.

O Movimento Modernista de 22 foi ingrato com Coelho Neto e Lima Barreto.

Injustiçado como Coelho Neto foi o inspiradíssimo escritor Júlio Dantas.

Dantas deixou pelo menos 40 livros publicados, incluindo poesia, romance, história. É dele a peça de teatro A Severa. É dele também a peça Sóror Mariana e A Ceia dos Cardeais.

A Ceia dos Cardeais continua sendo encenada mundo afora até hoje, nas línguas mais diversas.

Em 2011, foi apresentada no Theatro Municipal de São Paulo.

Ceia por ceia, bobagem, pois histórias surgem e seguem quase sempre de modo incomum, aqui e alhures.

Há histórias simples e complexas, reais e inventadas. Reflexivas…

Do nada, Machado de Assis inventava histórias reais.

Do nada também há quem crie ficção do real.

A cada história que traz à tona, o escritor paulista de Araraquara Ignácio de Loyola Brandão se supera. Seus livros são todos bons, desde Zero, lançado em 1971 na Itália e aqui proibido pelos milicos de plantão.

Ignácio de Loyola Brandão

No conto Obscenidades para uma dona de casa, Brandão deixa o leitor babando. E quanto mais lê, o leitor baba. Muito bom. Trata de uma mulher que passa a receber cartas obscenas de um desconhecido. No começo ela não quer saber de nada, mas com o passar dos dias vai se envolvendo chegando ao desespero quando a carta demora pra chegar. E mais não digo.

Curiosidade: até o fim de 2024, Brandão havia escrito e publicado o espantoso número de 8 mil crônicas. Foi o que me disse.

Até 1980, Ignácio de Loyola Brandão havia publicado apenas oito livros. Até 2024, ele contabilizava exatos 58 títulos publicados, em francês, italiano, alemão e outras línguas mais.

Loyola Brandão é membro da Academia Brasileira de Letras, ABL, desde 2019. A cadeira que ocupa é a de número 11.

Machado de Assis conta num conto o caso de uma mulher casada que passa a receber cartas anônimas. Nessas cartas a pessoa que as manda sugere de forma incisiva que a destinatária pare de trair o próprio marido e de atacar os maridos alheios.

São muitas as cartas anônimas que a suposta adúltera recebe. Uma dessas cartas é interceptada pelo marido que até então de nada desconfiava.

O caso cá em pauta não termina bem.

Ah! Sim: ia-me esquecendo que há uma viuvinha nessa história do bruxo.

Digo com certeza que Machado de Assis foi o escritor que mais criou personagens viúvas na literatura brasileira. Dezenas e dezenas. Começa já no seu primeiro romance, Ressurreição (1872), segue em A Mão e a Luva (1874), em Helena (1876) e, entre outros mais, Memorial de Aires (1908).


Foto e ilustrações por Flor Maria e Anna da Hora

Contatos pelos [email protected], http://assisangelo.blogspot.com, 11-3661-4561 e 11-98549-0333

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