Uma convocação atípica do diretor Acácio Costa para uma reunião geral com a equipe da Rádio Estadão para falar sobre os resultados e a evolução do negócio deixou no ar uma interrogação entre todos e foi também a senha para a confirmação de que vinha tempo ruim pela frente.
De fato, o objetivo do encontro, em 5/10, pela manhã, era falar da nova reestruturação radical pela qual a emissora passaria, com relevantes mudanças na grade, encolhimento significativo na produção de conteúdos próprios e a dispensa entre 40 a 45 profissionais, de um total aproximado de 60 que ali trabalhavam.
Houve comoção no encontro, mas diante de um cenário adverso e de números desanimadores na receita, foram para o sacrifício profissionais com grande história na rádio – alguns desde os tempos da Eldorado original – e no jornalismo brasileiro, como Geraldo Nunes, Roxane Ré, Sergio Quintella (que no ano passado foi o único a conseguir entrevistar Roger Abdelmassih, médico foragido da polícia, e que este ano entrevistou também com exclusividade Andreas Von Richthofen), Vinícius França, Weber Lima, Marcel Naves, entre outros.
O lado mais perverso da decisão – os cortes na equipe – atingiu também profissionais que atuavam para a emissora no Rio e em Brasília (um em cada praça). A empresa, segundo apurou o Portal dos Jornalistas, manteve contato com o Sindicato dos Jornalistas para acertar as rescisões dentro do que determina a legislação trabalhista, informando aos dirigentes da entidade que as mudanças foram efetivadas em função de um alinhamento na programação.
No comunicado oficial, que certamente é muito mais dirigido ao mercado publicitário (diminuir o impacto da notícia negativa para não chamar ainda mais a atenção de eventuais anunciantes e patrocinadores), a empresa destacou a apresentação da nova grade de programação naquela 2ª.feira, evitando referências aos cortes. Salientou a ampliação do tempo do jornal matutino Estadão no Ar Primeira Edição em uma hora (agora veiculado entre 6h e 10h, de 2ª a 6ª.feira), com os âncoras Haisen Abaki e Alessandra Romano e um time de colunistas formado por Eliane Cantanhêde, Sonia Racy, José Roberto Mendonça de Barros, Alexandre Garcia, Luiz Antonio Prósperi, Gustavo Loyola, Paulo Saldiva, coronel José Vicente, entre outros.
A partir desse horário, conforme assinalou o comunicado, a emissora mesclará notas informativas e música de boa qualidade ao longo do dia. Às 20h, entra no ar o Estadão Noite, um programa musical com quatro horas de duração.
Manifestações dos que saíram – As redes sociais, em particular aquelas com participação predominante de jornalistas, foram inundadas por posts, muitos criticando a organização e dezenas de outros lembrando os bons tempos do jornalismo de qualidade da Rádio Eldorado, que formou várias gerações de profissionais, conquistando prêmios, prestígio e o respeito dos ouvintes. Obviamente o difícil momento econômico do País e a baixa resposta comercial, combinados com escolhas que se mostraram erradas ao longo do tempo, estão entre as razões da decisão do Grupo Estado de reduzir drasticamente os custos da Rádio Estadão. Com efeito, desde que foi lançada, em 2011, esta é a segunda mudança radical feita pela emissora, na busca de uma fórmula sustentável de sobrevivência.
Criada para ocupar o lugar da Eldorado, apostando na força do jornalismo do Estadão para alavancar audiência e receitas; pouco depois assinou contratado com a ESPN, mudando inclusive o nome para Rádio Estadão/ESPN e incorporando a marca da emissora de esportes. Com a inviabilidade da parceria, em 2013 voltou a assumir o controle, mantendo o jornalismo como eixo central; agora, corta na carne a produção própria de jornalismo, apostando numa programação majoritariamente musical.
Em sua página no facebook, Weber Lima desabafou nesta 3a.feira (6/10): “Uma coisa é certa na minha profissão, ela te deixa ‘cascudo’. A porrada foi forte, mas o negócio é levantar e seguir em frente. Estou mais uma vez buscando uma oportunidade. Ontem a equipe de esportes da Rádio Estadão fez sua última transmissão. Quero agradecer aos ouvintes que acompanharam o nosso trabalho. Vida que segue. Bora!!!”. Já Sérgio Quintella, que este ano se destacou pelo furo de reportagem com Andreas von Richthofen, mencionou seu filho pequeno, que acreditava ser “Rádio Estadão” o sobrenome do pai: “Uma vez eu perguntei para o meu filho, com dois anos à época, se ele sabia meu nome completo. Ele respondeu: ‘Sérgio Quintella Rádio Estadão’. De tanto ouvir minhas reportagens e entradas ao vivo pelo helicóptero, ele imaginava que a assinatura dos boletins fizesse parte do meu nome. Ele estava certo! Faz! Obrigado, Rádio Estadão! Obrigado, Grupo Estado! Foram cinco anos sensacionais em todos os sentidos. Fiz amigos que levarei para sempre. E guardarei comigo, para sempre, os resultados de todo o trabalho que foi feito com o maior amor do mundo”.