Por Luciana Gurgel
Ao mesmo tempo em que cresce a consciência sobre o impacto das mudanças climáticas e de práticas ambientais predatórias, aumenta também o risco para jornalistas que cobrem esses temas.
Essa é a conclusão de um relatório produzido pelo International Press Institute (IPI), de autoria da jornalista italiana Barbara Trionfi, ex-diretora da instituição.
Climate and Environmental Journalism Under Fire é resultado de entrevistas com 40 jornalistas em 21 países, traçando um quadro sombrio, que vai além dos riscos pessoais. Ele mostra como a liberdade de expressão é comprometida por essas ameaças, afetando negativamente os esforços para reverter a crise do clima.
A lista de problemas é longa: prisões, assédio legal; assédio online e campanhas de ódio nas redes; restrições à liberdade de circulação e obstáculos no acesso à informação − e é claro, a violência.
O caso do jornalista Dom Philips, assassinado na Amazônia junto com o indigenista Bruno Pereira, é um exemplo citado no trabalho. Ele documentava a situação no Vale do Javari para um livro, que até hoje não saiu.
A família e amigos conseguiram apoio para levar a obra até o fim, o que é uma exceção. Outros repórteres desistem de pautas ou morrem após denúncias, situação comum na América Latina e que afeta sobretudo jornalistas cidadãos ou de veículos comunitários, sem a proteção de grandes organizações.
Jornalistas atacados em suas comunidades
Este é um dos aspectos destacados no relatório. Trionfi aponta que muitos desses profissionais são freelancers e acabam atacados por membros de suas próprias comunidades envolvidos em atividades ilegais.
O estudo salienta ainda as ligações políticas, o poder econômico de atores ligados a atividades prejudiciais ao meio ambiente, a polarização em torno de questões climáticas, gerando hostilidade contra jornalistas, o envolvimento do crime organizado com essas atividades e a impunidade, que estimula a violência.
Os problemas acontecem em países com baixo grau de liberdade de imprensa, mas também em nações avançadas como a França.
Um dos cases apresentados no relatório narra a união de jornalistas ambientais na Bretanha para desafiar o que foi chamado de “lei do silêncio” na região, cobrando das autoridades a liberdade de expressão e acesso a informações sobre questões relacionadas ao agronegócio. Mais de 450 jornalistas e organizações de mídia subscreveram a carta.
O jogo é pesado. A jornalista investigativa Morgan Large personifica a extensão das ameaças: a rádio onde ela trabalhava foi invadida e perdeu propaganda de prefeituras locais. Seu cachorro foi envenenado. Ela foi alvo de assédio nas redes sociais e as rodas de seu carro foram afrouxadas duas vezes depois de reportagens críticas. Mesmo assim, pediu proteção e não conseguiu.
Hostilidades e ativismo
Barbara Trionfi observa que a hostilidade contra os jornalistas está ligada ao ativismo de duas formas, sobretudo na Europa e na América do Norte.
Em primeiro lugar, os jornalistas ambientais e climáticos dão voz a fontes críticas, incluindo cientistas que apontam verdades que os negacionistas não querem ouvir, seja por ideologia ou por contrariar interesses. E assim viram objeto de ataques.
Mas os próprios profissionais de imprensa acabam sendo vistos como ativistas da causa ambiental, mesmo quando são independentes e seguem as boas práticas jornalísticas.
Assim como a lista de problemas, a de soluções também é longa e não traz nada diferente do que já se sabe.
Aos jornalistas e empresas o relatório recomenda cuidados como avaliar os riscos de uma cobertura, a aliança com repórteres locais familiarizados com a região (no caso de matérias em locais remotos) e busca de colaboração entre veículos, inclusive transfronteiriça.
Os Estados são instados a garantir acesso às informações, prover segurança para os jornalistas ambientais e combater a impunidade.
O estudo também pede aos grupos de apoio ao jornalismo atenção à formação em segurança, fomento de redes de contato e suporte jurídico para defesa de profissionais que sofrem assédio judicial.
Embora não sejam conselhos novos, são vitais para apagar a fogueira que ameaça o jornalismo climático e ambiental.
O relatório completo pode ser visto aqui.
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