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sábado, novembro 23, 2024

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Samy Adghirni e os desafios da cobertura no Irã

Uma semana após o anúncio pela Folha de S.Paulo da criação do novo posto de correspondente internacional no Irã, Samy Adghirni, primeiro brasileiro a atuar na cobertura fixa daquele País, falou com exclusividade ao Portal dos Jornalistas sobre os desafios dessa nova experiência. Filho de marroquino com brasileira, Adghirni é formado em Jornalismo pela Universidade Stendhal de Grenoble, na França. Por lá atuou em diversos veículos, como Rádio França Internacional, Rádio BMF, France Presse e Trax Magazine. Em veículos brasileiros, fez parte da equipe de Mundo do Correio Braziliense. Transferiu-se para a Folha no final de 2007 e desde então cobriu conflitos em países como Egito, Líbia e Tunísia. Será o segundo correspondente fixo do jornal no Oriente Médio, que há mais de dois anos conta com a presença de Marcelo Ninio, em Jerusalém. Na nova divisão, Adghirni será também responsável pelos noticiários nos principais vizinhos do Irã, dentre eles Iraque, Afeganistão e Paquistão. Portal dos Jornalistas ? Como surgiu a ideia da criação de um posto fixo de correspondente no Irã? Samy Adghirni ? A ideia de abrir um posto em Teerã surgiu e amadureceu em conversas com a Secretaria de Redação, que acreditou valer a pena investir para ter um olhar próprio sobre o Irã. O país está todos os dias no noticiário internacional, mas há pouquíssimos jornalistas estrangeiros para contar o que de fato acontece na política, economia e sociedade iranianas. Ter um correspondente em Israel e outro no Irã permite uma cobertura muito mais abrangente, precisa e equilibrada do noticiário no Oriente Médio. PJ ? Há algum período pré-estabelecido para esse trabalho? Samy ? Trata-se de um posto fixo e, portanto, sem prazo de validade. Eventuais mudanças poderão ser decididas pela Secretaria de Redação em função da segurança e da dificuldade de cobertura num ambiente com algumas restrições. PJ ? Quais são as maiores dificuldades que você espera ou que já vem encontrando? Samy ? O governo me concedeu uma autorização para trabalhar como correspondente internacional no país, algo raríssimo diante das crescentes tensões entre Irã e potências ocidentais. Nesse sentido, a Folha faz parte de um grupo muito seleto de veículos internacionais com permissão para cobrir tudo o que acontece no país. Isso dito, é preciso trabalhar dentro da legalidade imposta pelas autoridades. O governo pede, entre outras regras, para ser avisado se eu quiser fazer matérias fora de Teerã. A língua também é um problema. Pouca gente fala inglês e aprender farsi levará certo tempo. Enquanto isso tenho trabalhado com a ajuda de tradutores. PJ ? Que paralelo você traçaria entre a liberdade e segurança (ou falta dela), para realizar esse novo trabalho, comparado com os períodos em que esteve na Tunísia, Líbia e Egito? Quais desses locais oferecem melhores e piores condições de trabalho? Samy ? Tunísia, Egito e Líbia estão passando por processos de mudança profunda, mas os jornalistas, locais como estrangeiros, já encontram muito mais liberdade que antes da chamada Primavera Árabe para exercer sua profissão. A Líbia de Muammar Gaddafi era um dos piores países para se trabalhar como jornalista. Hoje em dia acho que a Síria é o lugar mais repressor do Oriente Médio. Comparado com as ditaduras árabes, o Irã oferece mais liberdade. Em termos de segurança pessoal, o Irã é muito tranquilo, já que tem baixíssimos índices de criminalidade e não se trata de um país em guerra. PJ ? Recentemente houve o problema com o Germano Assad, correspondente também da Folha, que ficou quatro dias preso na Síria. Em algum momento de suas coberturas pelo oriente Médio você sentiu que corria esse risco? Samy ? A revolução egípcia, no início do ano, foi o período mais difícil, já que jornalistas passaram a ser caçados como alvo legítimo pelos partidários do então ditador Hosni Mubarak. Havia uma ação coordenada contra a mídia estrangeira. Colegas brasileiros e eu tivemos que organizar juntos nossa fuga do centro da cidade para evitar que fossemos presos ou espancados, como aconteceu com tantos enviados especiais. No auge da guerra na Líbia havia o perigo de morrer a qualquer instante por causa dos conflitos pesados entre rebeldes e governistas, mas não havia uma campanha orquestrada contra jornalistas. Éramos vítimas potenciais como qualquer outra pessoa que estivesse no país. PJ ? Há alguma restrição por questões de segurança para que você não visite determinados países em suas coberturas? Samy ? Não há uma lista de países vetados. Trabalhamos estudando caso a caso. Quando o jornal envia um repórter para uma área de risco, fazemos diariamente uma avaliação das condições de segurança. Sempre há uma passagem de volta pronta para o enviado especial. O bom senso sempre deve prevalecer para que o jornalista não vire notícia. PJ ? O que significa esse novo desafio em sua carreira? Samy ? É uma oportunidade extraordinária acompanhar de dentro a realidade de um país que está constantemente sob os holofotes, mas na verdade é muito pouco conhecido. As pessoas ainda acham que o Irã é um país árabe, que está em estado de guerra, que xiismo é sinônimo de radicalismo etc. O Irã é uma potência multimilenar, com uma cultura riquíssima e um povo altivo e educado. A história iraniana não pode ser resumida ao momento atual de tensão com o Ocidente nem à questão nuclear. Cada dia em Teerã já está sendo um enorme aprendizado sobre o Irã e sobre como funciona a geopolítica mundial. Há muitas boas histórias para serem contadas aqui.

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