Veículos de imprensa de todo o País anunciaram que mudarão suas políticas de cobertura de massacres, após a repercussão negativa sobre a postura da imprensa nacional ao noticiar o ataque a uma creche em Blumenau (SC), na manhã dessa quarta-feira (5/4).
Durante todo o dia, veículos compartilharam em suas plataformas, canais e redes sociais fotos do autor do ataque, além de dados de sua vida, vídeos do atentado e detalhes do ocorrido. Especialistas no assunto explicam que esta intensa cobertura pode influenciar outras pessoas a cometerem as mesmas atrocidades, aumentando a probabilidade de novos ataques.
Esse tema já havia sido levantado no final de março, devido à cobertura de outro ataque, em uma escola estadual em São Paulo. A imprensa também veiculou diversas fotos e vídeos do ocorrido.
O Grupo Globo anunciou que todos os seus veículos deixarão de publicar o nome e imagens dos autores dos crimes, além de vídeos das ações. A empresa explicou que, até então, publicava apenas uma única vez o nome e a foto de autores, mas a partir de agora, a política será ainda mais restritiva.
“A decisão segue as recomendações mais recentes de prestigiados especialistas no tema, para quem dar visibilidade a agressores pode servir como um estímulo a novos ataques”, declarou a Globo. “Estudos mostram que os autores buscam exatamente esta ‘notoriedade’, por pequena que seja”.
O Estadão também publicou em nota que deixará de publicar fotos, vídeos, nome ou outras informações dos autores de ataques semelhantes: “A exposição pode levar a um efeito de contágio, de valorização e de estímulo do ato de violência em indivíduos e comunidades de ódio, o que resulta em novos casos. A visibilidade dos agressores é considerada como um ‘troféu’ dentro dessas redes”.
O Grupo Liberal, do Pará, escreveu que também não publicará mais nomes, fotos e imagens de ações, e demais informações, sobre autores de ataques. “Esperamos que, com essa nova abordagem, possamos contribuir para a construção de uma sociedade mais pacífica”, declarou a empresa.
Outros veículos como Folha de S.Paulo e Folha de Pernambuco adotaram a mesma postura.
A Associação de Jornalistas de Educação (Jeduca) indicou alguns pontos que devem ser discutidos durante a cobertura desses tipos de ataques. A entidade elaborou em 2019 um guia sobre a cobertura de atentados a escolas, e realizou um webinar sobre o assunto com as pesquisadoras Catarina de Almeida Santos, da Universidade de Brasília, e Telma Vinha, da Universidade Estadual de Campinas.
Entre os tópicos levantados pela Jeduca, estão considerar que ataques a escolas são fenômenos complexos e, portanto, é preciso evitar tirar conclusões precipitadas e sempre analisar o ocorrido sob diferentes perspectivas; evitar o chamado “efeito contágio”, que ocorre ao compartilhar diversas imagens e vídeos do autor do crime, o que pode estimular uma espécie de glorificação e aumentar a probabilidade de novos ataques acontecerem; evitar generalizações e abordagens apressadas; preservar a identidade dos estudantes envolvidos; entre outros.
“As coberturas extensivas, que, muitas vezes, apresentam repetidamente as imagens do ataque, contam a história de vida do agressor ou mostram detalhes do evento podem influenciar diretamente outros jovens e adolescentes a fazerem o mesmo”, explica a entidade.
“Quanto maior a exposição do agressor na mídia, maior a sua notoriedade, que geralmente é um dos objetivos dos ataques a escolas. Uma grande exposição do agressor gera um processo de ‘santificação’ do agressor entre seus pares, porque ele passa a ser visto como um grande exemplo. A difusão de fotos e vídeos do ataque funciona como um incentivo à repetição do acontecimento porque é vista pelos pares como um reforço à sua suposta competência. Além disso, a divulgação dos detalhes serve para criar um modelo para outros atentados”.
Confira as recomendações da Jeduca aqui.